Deadpool popularzão. Zueiro. Hue hue BR. Tá aí um fenômeno que eu não esperava estar vivo pra ver.
Aliás… você aí, garoto juvenil… senta aqui que o tio vai te contar uma história: eu fui adolescente nos anos 90. Uma época estranha. Pra cacete. Foi nessa época que todos os super-heróis começaram a morrer. Ou ficar tetraplégicos. Ou ganhar clones. Ou perder os poderes. Essa época era tão, mas tão doida, que pra ser desenhista de quadrinhos nem mesmo era preciso saber desenhar. Sério.
Muita, mas muita coisa ruim foi produzida. O mercado de colecionadores estava altamente aquecido, então qualquer revista que estampasse um “Nº1” na capa era rapelada das prateleiras rapidamente por especuladores, sem perceberem que nada que é produzido na casa dos milhões de unidades tem valor como colecionável. Wolverine era uma febre e figurava em nove entre dez capas da Marvel. A era dos anti-heróis estava instaurada e Deadpool é seu filho mais bem sucedido. Mas nessa época ele não era da zueragem. Ele era um vilão genérico, com poderes genéricos, uniforme genérico e um senso de humor peculiar.
E por que eu estou falando de tudo isso ao invés de focar no filme? Porque tudo cobra um preço.
Junto com a qualidade do produto, a Marvel também despencou e chegou a declarar falência. Para fugir das dívidas crescentes, vendeu a preço de banana os direitos de vários de seus personagens. Foi assim que o Homem-Aranha foi parar na Sony e os X-Men na Fox. Foi assim que a Fox fez X-Men faturar mais de 300 milhões de dólares. Foi assim que uma cagada administrativa mudou a ordem dos eventos e transformou o cinema dos últimos 16 anos. Foi assim que se tornou possível eu ter acabado de sair de uma sessão de cinema que exibiu um filme de um personagem secundário, praticamente um subproduto, e que há pouco mais de 20 anos sequer existia. Foi assim que o universo se contorceu para que um plágio, criado por um artista incompetente, se transformasse em fenômeno. Um dos filmes mais aguardados dos últimos tempos. Respect, Teoria do Caos.
Aliás… caos é uma palavra que define bem Deadpool (agora sim o filme). No melhor sentido da palavra, diga-se de passagem. Honrando a tradição do personagem nos quadrinhos, a adaptação para o cinema é uma longa piada de 1h47m, repleta de referências ao universo pop e aos próprios personagens e atores do filme, humor físico, violência estilizada, diálogos mordazes e/ou lascivos e muitos, muitos recursos vindos da animação. Não por acaso, já que o diretor Tim Miller faz sua estreia no live-action carregando toda sua experiência em animação para distorcer o tempo, os ângulos e os cortes de uma maneira que só a magia 3D é capaz de proporcionar.
Agora convenhamos: Ryan Reynolds não é o melhor ator do mundo (e o próprio longa faz piada com isso) mas o papel lhe cai como uma luva. Reynolds e sua cara de bobão colecionam uma bela cota de fracassos e dessa vez, tenho que adminitr, temos um acerto. É impossível, a partir de agora, separar ator e personagem. Há uma empatia imediata que não ocorria desde que vimos Robert Downey Jr. como Tony Stark pela primeira vez.
Deadpool quebra pernas e braços (os próprios, por vezes) e também a quarta parede. Ou a oitava. Ou a décima sexta parede. São tantas interações, flashbacks e cenas de ação que lá pela metade do filme temos a impressão de ter participado de um curso de leitura dinâmica ministrado por um palestrante hiperativo. Estranhamente o fluxo de adrenalina constante não atrapalha, tanto que no segundo ato, quando temos um breve descanso da aleatoriedade de piadas e referências para vermos a história se encaminhar para o clímax, o ritmo parece errado, lento, tedioso. Felizmente isso dura apenas 15 ou 20 minutos, até sermos conduzidos para o terceiro ato com mais insanidade, gente morta e humor non-sense.
Não importa o quão inadequada e inoportuna seja a origem do personagem, as adaptações de personalidade que sofreu ao longo dos anos ou as diferentes alternativas narrativas experimentadas até termos um personagem/paródia tal qual o que existe hoje. O que importa é que os super-heróis no cinema estão em um momento em que é possível se esbaldar com algo tão deliciosamente dispensável quanto Deadpool. E que venha a franquia.
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